Atacante da seleção brasileira, Ary Borges fala sobre racismo contra Vini Júnior e abraço de atletas a Cuca, condenado por ato sexual com menor: “Me deixou muito chocada como mulher”
Recife - “Sou mulher, negra, nordestina. A consciência social é muito natural para mim. É meu estado físico puro.”
Ariadina - ou só Ary Borges - escolheu carregar responsabilidades inerentes à própria história. Nascida em São Luís do Maranhão, e agora vivendo 6 mil km mais distante - em Louisville, nos Estados Unidos -, a atacante da seleção brasileira buscou referências no futebol quando mais nova. Agora, aos 23 anos e em crescente na carreira, entende ser preciso ela mesma assumir esse posto de influência.
- Eu sempre quis ter exemplos no esporte que amo. A partir do momento que me tornei alguém que influencia outras pessoas, é o meu momento de ser aquilo que eu queria que fossem para mim.
É natural, mas eu sempre tento me posicionar. Existem coisas que vão além da Ary atleta.
— explica a brasileira, nordestina e maranhense.
As palavras não são à toa. Tanto que - após quase uma hora de conversa - a própria atacante chama a atenção para mais uma pauta social: o caso de racismo sistemático contra Vini Júnior, na Espanha.
- Acho que seria um momento para falar do que está acontecendo com o Vinicius. Não é a primeira vez, nem a segunda, acho que é um momento do futebol em si falar sobre o assunto - diz a atacante.
Os casos de racismo contra Vini Júnior têm ocorrido de forma constante desde 2021, mas ganhou nova repercussão em escala mundial após as agressões da torcida do Valencia, em confronto com o Real Madrid no dia 22 de maio. Pela primeira vez, clube e o técnico Carlo Ancelotti se pronunciaram cobrando ações da La Liga.
- É um momento de mostrar apoio para o Vinicius e para todo mundo que já sofreu um caso parecido. Dizer que estamos juntos. Porque o racismo não combina com nada, muito menos com o futebol - continua Ary.
Os maiores jogadores da nossa história são pessoas negras. Vini que é o melhor jogador brasileiro na atualidade é negro.
— completa a atacante.
O episódio não é o único. Há exatamente um mês, no dia 26 de abril, Ary tornou-se uma das atletas - além do time feminino do Corinthians - a falar sobre o caso Cuca. Condenado na Suíça por “ato sexual com menor” e sem nunca cumprir a pena, o técnico foi criticado pela torcida corintiana e saiu do clube sendo literalmente abraçado pelos atletas do time masculino - após uma vitória na Copa do Brasil.
- Aquela situação me incomodou muito. Foi algo que me deixou muito chocada como mulher. Eu particularmente não sabia do caso antes e você ver tudo que é mostrado, as provas, e ver jogadores indo abraçar o treinador dessa forma... foi algo que mexeu muito comigo - confessa.
Ary fala sobre como esses posicionamentos influenciam na sociedade e que não gostaria de ter o exemplo dado à própria família e amigos. Ela faz questão de valorizar a atitude das atletas - que postaram uma nota em conjunto sobre o tema. Depois disso, inclusive, uma crise se instaurou no clube. Mas não há arrependimentos: o protesto seria feito até mesmo de forma individual.
- Achei fantástico a forma que elas se posicionaram. Nada como um clube vitorioso como o Corinthians para isso. Tem aquela questão de “tem que ter resultado para poder falar” e elas são um belo exemplo disso.